Corpo e Sangue
Acabamos de viver mais um feriadão e muitos sequer sabem o
que estávamos celebrando. Vamos lá! O calendário católico registra a Festa de
Corpus Christi (Corpo de Cristo), realizada sempre na quinta-feira seguinte ao
domingo da Santíssima Trindade. É crença na presença do corpo e sangue de
Cristo no sacramento da Eucaristia instituído durante a última ceia.
Jesus rompeu barreiras e enfrentou
preconceitos, propôs uma forma de vida baseada no respeito ao semelhante.
Convidou todos ao exercício do perdão, a dar a outra face. Ensinou a humildade
ao lavar os pés dos discípulos e deu a própria vida na cruz em sacrifício pelo
seu povo. Exemplos fortes e difíceis de serem colocados em prática,
especialmente nos tempos atuais.
No último censo, 87% da população
brasileira declarou-se católica. 22,6% cristã de vários movimentos, entre os
quais adventistas, batistas, evangélicos, luteranos, metodistas,
presbiterianos, pentecostais, episcopais e restauracionistas. Várias
outras denominações religiosas também defendem a cultura da vida e da paz.
Diante de uma estatística dessa, como explicar tanta violência e intolerância?
Nas mesas dos brasileiros, pouco a pouco
a tradicional oração em agradecimento ao alimento é substituída pelo noticiário
televisivo. Enquanto saboreiam um prato de macarrão ao sugo. Todos estão com
suas atenções voltadas a mais um caso de violência. O repórter insiste em
perguntar a mãe enlutada ou a recém-viúva qual o sentimento naquele instante. O
apresentador fala de modo incisivo e pede intermináveis repetições das cenas de
assassinatos. De modo enfático lança palavras de ordem. Todos estão estáticos
enquanto o sangue que escorre pela calçada parece atravessar a tela do moderno
televisor de alta definição.
É
como se todos nós estivéssemos impregnados por aquele líquido que, ainda,
parece tão quente. Ao beber a cerveja ou o refrigerante é como se estivessem
ingerindo um cálice de sangue. O espetáculo dantesco prossegue e logo começam
os brados de justiça, a crítica repetitiva ao sistema judiciário e apelos pela
redução da maioridade penal e implantação da pena de morte.
Naquela
mesa ninguém pergunta como foi o dia do outro. Ninguém comenta fatos tão
singelos e belos do cotidiano, como o simples ato de acordar, caminhar,
trabalhar, estudar e possuir uma família, um lar, um local para recuperar as
energias. Estão todos hipnotizados pela insistente enxurrada de fatos
negativos, de violência e de morte. No final, seguem aliviados porque a
tragédia abateu-se em outro lar que não o seu.
Aos poucos todos começam a reproduzir a
mesma violência que juram combater. Em casa e no trabalho se tornam agentes da
morte. A cordialidade dá espaço ao acirramento das relações. Motoristas e
motociclistas transformam seus veículos em armas letais na guerra do
trânsito. Alguns adquirem armas de fogo imaginando que estarão mais
protegidos. Nos estádios de futebol gladiadores uniformizam-se como se as
camisetas dos clubes fossem armaduras. Até na moda a exaltação medieval às
caveiras retornou presente nas roupas e acessórios.
Em seus ensinamentos o Mestre afirmou
“eu vim para que tenham vida, e a tenham com abundância” (João 10:10) passado
tantos anos, ainda, não aprendemos a experimentar esta vida plena. Mas Ele é
paciente e aguarda que um dia cheguemos lá.
Que o Príncipe da Paz possa nos inspirar
na convivência tolerante e fraterna, capaz de justificar seu sacrifício
supremo.